FUGA DE TALENTOS NA ELITE MILITAR
Baixa remuneração e demora de ascensão na carreira estão entre os
motivos para a fuga de oficiais formados em escolas da Marinha, do Exército e
da Aeronáutica. O setor privado e até o serviço público estão mais atraentes. A
debandada de especialistas preocupa as Forças Armadas.
Enquanto o governo brasileiro centra as atenções da Estratégia Nacional
de Defesa no reaparelhamento do Sistema de Defesa Nacional, as Forças Armadas
se deparam com uma evasão sem precedentes em seus quadros técnicos. A elite dos
oficiais formados nas escolas da Marinha, do Exército e da Aeronáutica está
optando cada vez mais por deixar a vida militar em busca de melhores salários e
oportunidades de crescimento profissional na iniciativa privada e no
funcionalismo público civil. Só em 2012, 245 oficiais militares deixaram as
instituições. É como se um oficial deixasse o contingente militar brasileiro a
cada dia útil do ano. Foi o maior volume de pedidos de demissão registrados
entre militares do círculo de oficiais desde 2006. Só nos primeiros três meses
deste ano, o Diário Oficial da União registrou a saída de outros 54 oficiais.
"Ninguém assume isso lá dentro, mas o fato real é que, além do
mérito, a questão política é um fator fortíssimo para um coronel ascender a
general."
A fuga de cérebros das Forças Armadas cresce no momento em que o país vê
com preocupação crescente a questão da defesa de fronteiras e de seus recursos
naturais, sobretudo em função da descoberta de jazidas de petróleo na camada
pré-sal. A perda de capital humano com a migração de militares para a
iniciativa privada se soma ao prejuízo financeiro para o Estado. Cálculos
extraoficiais estimam que a formação de um piloto da Aeronáutica custe em torno
de R$ 1,2 milhão aos cofres públicos, incluindo não só o preço das horas-aula,
mas também o internato do aluno, as horas de voo e o combustível das aeronaves
utilizadas no treinamento.
Por conta disso, o oficial que pendura a farda é obrigado a pagar à
União uma indenização inversamente proporcional ao seu tempo de permanência na
Força. O interesse nesses especialistas é tão grande que, não raro, a empresa
que contrata o ex-militar assume o valor da multa. Não repõe, contudo, a perda
de um profissional intensamente treinado, com conhecimento profundo de questões
estratégicas para o país.
Fontes ouvidas pelo Correio na ativa e na reserva atestam a preocupação existente no comando das três Forças, que têm investido em estudos para detectar o motivo de profissionais altamente qualificados abandonarem a estabilidade de uma carreira militar, mesmo com o clima de incerteza na economia. Falham em perceber que a defasagem dos salários em relação à iniciativa privada é o principal motivo para o abandono da farda.
Essa discrepância salarial é bem ilustrada na carreira de piloto, um dos
alvos principais dos caça-talentos que miram nas turmas que se formam todos os
anos em escolas militares de alto nível, como a Academia da Força Aérea (AFA).
Um coronel da Aeronáutica, topo da hierarquia do círculo de oficiais superiores
da Força, se aposenta com vencimentos líquidos da ordem de R$ 9,3 mil, aí
incluídos o soldo e os adicionais relativos à habilitação do militar e, nos
casos pertinentes, à permanência de três anos além dos 30 anos mínimos para o
encerramento do ciclo de sua patente. Um piloto de helicóptero trabalhando para
empresas de voo offshore — segmento em franca expansão por conta da exploração
de bacias do pré-sal — ganha um salário médio de R$ 25 mil, mais uma série de
benefícios.
Desmotivação
A lentidão com que se galga postos na carreira militar é outro fator que
tem contribuído para desmotivar as gerações mais jovens de militares. Depois de
passar pela academia e receber a patente de segundo-tenente, um militar do
Exército, por exemplo, leva em média dois anos para chegar a primeiro-tenente.
Seu vencimento líquido sobe, em valores atuais, de R$ 5.348,28 para R$
5.509,07. Serão mais três anos para ascender ao posto de capitão, ganhando R$
5.943,02 por mês. Ou seja, em cinco anos de carreira com dedicação exclusiva,
podendo ser deslocado periodicamente de cidade com toda a família, um oficial
do ciclo subalterno vê o salário aumentar apenas R$ 594 ,74.
A dificuldade de um militar das áreas-meio — como engenheiros, pilotos e
médicos — aos postos do círculo de oficiais-generais é outro ponto citado com
frequência como um desestímulo para esses profissionais permanecerem nos
quadros das Forças Armadas. "Ninguém assume isso lá dentro, mas o fato
real é que, além do mérito, a questão política é um fator fortíssimo para um
coronel ascender a general. E essa regra não é válida só no Exército. É o mesmo
na Marinha e na Aeronáutica", diz um oficial da reserva que pediu
anonimato.
Correio Braziliense
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